terça-feira, 30 de dezembro de 2008

PEQUENO TRIBUTO À LEGIÃO URBANA.


"PAIS E FILHOS"
Estatuas e cofres
E paredes pintadas
Ninguém sabe o que aconteceu
Ela se jogou da janela do quinto andar
Nada fácil de entender
Dorme agora e só o vento lá fora
Quero colo
Vou fugir de casa
Posso dormir aqui
Com você?
Estou com medo tive um pesadelo
Só vou voltar depois das três
Meu filho vai ter
Nome de santo
Quero o nome mais bonito
(chorus)
É preciso amar as pessoas
Como se não houvesse amanhã
Por que se você parar pra pensar
Na verdade não há
Me diz por que o céu é azul
Explica a grande fúria do mundo
São meus filhos que tomam conta de mim
Eu moro com a minha mãe
Mas meu pai vem me visitar
Eu moro na rua não tenho ninguém
Eu moro em qualquer lugar
Já morei em tanta casa que nem me lembro mais
Eu moro com os meus pais
(chorus)
Sou uma gota d'água
Sou um grão de areia
Você me diz que seus pais não lhe entendem
Mas você não entende seus pais
Você culpa seus pais por tudo
Isso é absurdo
São crianças como você
O que você vai ser
Quando você crescer?
(chorus)
AINDA É CEDO


Uma menina me ensinou


Quase tudo que eu sei


Era quase escravidão


Mas ela me tratava como um rei


Ela fazia muitos planos


Eu só queria estar ali


Sempre ao lado dela


Eu não tinha aonde ir


Mas, egoísta que eu sou,


Me esqueci de ajudar


A ela como ela me ajudou


E não quis me separar.


Ela também estava perdida


E por isso se agarrava a mim também


E eu me agarrava a ela


Porque eu não tinha mais ninguém.


E eu dizia:


- Ainda é cedo


cedo cedo


cedo cedo.


Sei que ela terminou


O que eu não comecei


E o que ela descobriu


Eu aprendi também, eu sei.


Ela falou: - Você tem medo.


Aí eu disse: - Quem tem medo é você.


Falamos o que não devia


Nunca ser dito por ninguém .


Ela me disse: - Eu não sei mais


o que eu sinto por você.


Vamos dar um tempo,


um dia a gente se vê.


Aí eu disse:


- Ainda é cedo


cedo


cedo


cedo


cedo.


ESSE É O DISCO EM QUE A MUSICA ÍNDIOS FOI GRAVADA E FOI UM DOS GRANDES SUCESSOS NA ÉPOCA DA BANDA LEGIÃO URBANA.


INDIOS

Quem me dera, ao menos uma vez

Ter de volta todo o ouro que entreguei a quem

Conseguiu me convencer

Que era prova de amizade

Se alguem levasse embora até o q eu não tinha.





Quem me dera, ao menos uma vez,


Esquecer que acreditei que era por brincadeira


Que se cortava sempre um pano de chão


De linho nobre e pura seda.




Quem me dera, ao menos uma vez,


Explicar o que ninguem consegue entender:


Que o que aconteceu ainda está por vir


E o futuro não é mais como era antigamente.




Quem me dera, ao menos uma vez,


Provar que quem tem mais do que precisa ter


Quase sempre se convence que não tem o bastante


E fala demais por não ter nada a dizer.




Quem me dera, ao menos uma vez,


Que o mais simples fosse visto como o mais importante


Mas nos deram espelhos


E vimos um mundo doente.




Quem me dera, ao menos uma vez,


Entender como um só Deus ao mesmo tempo é três


E esse mesmo Deus foi morto por voces -


É só maldade então, deixar um Deus tão triste.




Eu quis o perigo e até sangrei sozinho.


Enetenda - assim pude trazer você de volta pra mim,


Quando descobri que é sempre só você


Que me entende do inicio ao fim


E é só você que tem a cura pro meu vicio


De insistir nessa saudade que eu sinto


De tudo que eu ainda não vi.




Quem me dera, ao menos uma vez,


Acreditar por um instante em tudo que existe


E acreditar que o mundo é perfeito


E que todas as pessoas são felizes.




Quem me dera, ao menos uma vez,
Fazer com que o mundo saiba que seu nome


Está em tudo e mesmo assim


Ninguem lhe diz ao menos Obrigado.




Que me dera, ao menos uma vez,


Como a mais bela tribo, dos mais belos índios,


Não ser atacado por ser inocente.




Eu quis o perigo e até sangrei sozinho.


Entenda - assim pude trazer você de volta pra mim,


Quando descobri que é sempre só você


Que me entende do inicio ao fim


E é só você que tem a cura pro meu vicio


De insistir nessa saudade que eu sinto


De tudo que eu ainda não vi.




Nos deram espelhos e vimos um mundo doente


Tentei chorar e não consegui......









FELIZ ANO NOVO!!!

MUITA LUZ,SORTE,PAZ,HARMONIA,SAUDE,DINHEIRO,FÉ,ESPERANÇA,SABEDORIA,FORÇA,DIGNIDADE,AMOR E PROSPERIDADE EM 2009 A TODOS!!!!! QUE DEUS SEJA A RAZÃO DE TUDO EM NOSSAS VIDAS!!!

















































DORMINDO COM BEBÊS.


Postado por Alysson Muotri em 19 de Dezembro de 2008 às 08:47


Neste texto, faço uma pausa no assunto células-tronco e volto paras minhas reflexões sobre como nos definimos como humanos. Em visita ao zoológico de San Diego (aliás, altamente recomendável para quem visitar a região) tive a oportunidade de observar pequenos filhotinhos de primatas dormindo com seus pais. Os filhotes pareciam superconfortáveis, seguros, num sono descompromissado e restaurador.

Depois, em conversa com um amigo primatólogo, descobri que a maioria dos primatas não-humanos tem o hábito de dormir com seus bebês. Não acredito que isso tenha sido extensivamente estudado, talvez pelas dificuldades do trabalho de campo ou mesmo pelo respeito ao animal em cativeiro. Enfim, acho que isso é apenas uma observação de grupos que trabalham com primatas que sugere um comportamento comum. Mas e os humanos? Eles dormem com seus bebês?


Note-se que não tenho filhos, então me senti completamente confortável de pesquisar sobre o assunto, sem nenhum pré-conceito ou qualquer introdução prévia. O começo da minha pesquisa parecia fácil, bastaria perguntar para casais que tiveram filhos se eles dormiam ou não com os filhos. Para meu espanto, descobri que isso era um tabu. As pessoas não se sentiam confortáveis em falar sobre o assunto. É realmente interessante, pois nunca tinha prestado a atenção nisso e, na verdade, não vemos muito esse comportamento humano retratado em filmes, seriados ou qualquer outra forma de mídia na cultura ocidental. Muito curioso, pois isso deveria ser um comportamento “normal” dos humanos.

Pois bem, aos poucos, consegui alguns comentários curiosos de casais que estavam para ter filhos ou que os tinham tido há pouco. Na verdade, os comentários estavam vindo dos médicos pediatras: “Nunca durma na mesma cama com seu bebê”. Mais do que um comentário ou sugestão, a frase está mais para uma ordem a ser seguida. A razão aparente, é que um adulto dormindo poderia sufocar o recém nascido durante um descuido. E o que esperar de pais de primeira viagem depois dessa explicação aparentemente lógica? Que vão seguir as ordens do pediatra sem questionar, afinal ninguém quer ser responsável pela morte do próprio filho, ainda mais nessas condições.

No entanto, a explicação dos pediatras ocidentais me pareceu um pouco forçada. Perguntei-me quantos bebês já haviam morrido dessa forma. Para meu espanto, a resposta que obtive não foi clara, mas sim tendenciosa. Isso porque a maioria dos trabalhos relatando esse tipo de morte não é causal. Mesmo em casos nos quais o bebê morria sozinho na cama dos pais, o evento era classificado como morte causada porque os pais dormiam junto com os bebês. Nos poucos casos em que a causa foi devidamente investigada, descobriu-se que não tinha qualquer relação com dormir ou não junto aos pais. Em geral, uma infecção ou má-formação de algum órgão interno era a causa da morte.

Descobri então que a recomendação de nunca dormir com bebês era apenas uma hipótese sem qualquer base cientifica. Na verdade, a recomendação médica ocidental atual está contrariando o que se observa com outros primatas. Por que isso? A primeira vez que esse tipo de recomendação apareceu em um livro foi em 1901, num guia leigo para pais escrito por um homem solteiro com nome de mulher (The Baby, Marianna Wheeler, Harper Bros, London). Recomendações do tipo “Nunca manipule muito os bebês, eles devem passar a maior parte do tempo dormindo sozinhos” estão lá. A partir daí, outros guias leigos começaram a ensinar os pais a “resolver” os problemas de sono dos bebês deixando-os sozinhos, chorando até cansar. Hoje em dia isso soa estranho, pelo menos para mim…

Esses livros foram baseados na ideologia econômica e religiosa vigente da época. Além disso, existia um medo que os bebês pudessem presenciar atividades sexuais dos pais e ficassem traumatizados pelo resto da vida. Soma-se a isso o surgimento de conceitos como o de “amor romântico”, onde a relação conjugal ideal entre marido-esposa exclui a presença dos filhos, do individualismo e da autonomia infantil como forma de independência e do surgimento de “especialistas em bebês” que escreviam diversos livros para leigos, perpetuando essas idéias.

Esses conceitos foram definindo onde os bebês deveriam dormir: sozinhos, se possível num quarto separado. Foram levados em conta fatores históricos, morais, culturais para definir o que era “normal e saudável”, mas não fatores biológicos. Vemos aí a imposição da hierarquia de valores nos pais: na esfera social o “bom” bebê versus o “mau” bebê e na esfera “cientifica” o bebê mais desenvolvido e superior versus o bebê mimado e inferior. Afinal, se dormir sozinho é bom para o bebê, então bons bebês dormem sozinho, certo?

O problema é que esses conceitos entraram como pseudociência em consultórios e livros médicos. Ora, a idéia era tornar os bebês independentes o mais rápido possível. Assim eles estariam “prontos para o duro mundo dos adultos”. Acho que o que fica dessa história toda é a questão da independência do bebê. Mas o que significa deixar um bebê independente? O pior é que bebês não foram programados para ser independentes, pelo contrário. Um dos custos da expansão cerebral dos humanos é que o cérebro humano não está formado ao nascer. O bebê humano nasce dependente do contato. Sem contato com outros indivíduos, morre.

Poderíamos fazer o caminho inverso e perguntar qual a real necessidade fisiológica do bebê. Para isso, teríamos de deixar de lado o que esperamos socialmente dos bebês e começar a olhar qual é a real biologia da relação entre recém-nascidos e pais. Por quê os bebês precisariam dormir junto com alguém? Brevemente, posso pensar em algumas razões do tipo: proteção, monitoramento, fácil acesso à alimentação, redução do número de episódios de choro, os pais conseguem dormir mais e melhor (verificado experimentalmente), mais tempo com os filhos, conhecendo-os melhor e curtindo-os.

Achei alguns trabalhos científicos onde os autores acompanharam por vinte anos as características de bebês que haviam se tornado “independentes” no conceito ocidental (não chora e dorme muito), com outros que viviam em comunidades alternativas e que tiveram um contato maior com os pais, inclusive dormindo juntos. Não se encontrou evidência social, cognitiva, emocional ou fisiológica que demonstrasse alguma vantagem em bebês que dormem sós. Por outro lado, os bebês que dividiram a cama com os pais tinham menor representação em grupos com doenças psiquiátricas, demonstravam um melhor conforto com a identidade sexual, eram adultos mais independentes, com melhor controle emocional e de estresse (Heron, 1994).

Nos meus estudos, acabei concluindo que dormir juntos com bebês não é anormal. Ao contrário, deveria ser mais estimulado, pois não é perigoso ou inapropriado, além de ter uma conseqüência positiva no individuo adulto. A forma como é praticado pode ser perigoso, é verdade, mas isso não é inerente ao ser humano.

PS: Como descrevi no texto, as observações aqui relatadas são baseadas em pesquisa pessoal e em alguns trabalhos científicos. As conclusões podem estar completamente erradas.

(Post publicado na coluna Espíral, no G1.)

MÉNAGE À TROIS.


Uma linha muito, muito fina separa as simplificações úteis, que ajudam a resumir de forma sucinta e relativamente precisa um conjunto de fatos, dos estereótipos grosseiros, que só servem para confundir a cabeça da gente. Quer um exemplo? O papel biológico do sexo feminino. Como elas tendem a produzir relativamente poucos óvulos perto da quantidade astronômica de espermatozóides fornecida por eles, parece fazer sentido que copulem com apenas um macho escolhido a dedo - afinal, já têm trabalho suficiente com a geração dos bebês. A promiscuidade, desse ponto de vista, teria vantagens apenas para o lado masculino da equação. OK. Agora ligue para as fêmeas dos grilos pra ver se elas caem nessa conversinha.


Eu explico: um conjunto intrigante de observações está começando a demolir esse machismo biologicamente institucionalizado, revelando que ceder aos encantos de múltiplos machos pode fazer um bem considerável às fêmeas e aos seus futuros bebês - ao menos em algumas espécies, entre as quais um grilo típico da Oceania. De quebra, outro quase-dogma tende a bambear: a idéia de que a qualidade genética do papai é a única contribuição masculina para a boa saúde dos bebês. O maluco aqui é que, sem querer, um macho pode contribuir para o sucesso dos ovos fertilizados por outrem - uma situação quase tão constrangedora quanto um humano corneado que acaba criando os filhos da mulher com o amante.


Antes de mais nada, vamos conhecer o protagonista desse dramalhão: o grilo australiano Teleogryllus oceanicus, cuja vida sexual está sendo esmiuçada por Francisco García-González e Leigh Simmons, dupla do Centro de Biologia Evolutiva da Universidade da Austrália Ocidental. No caso dessa espécie, um fato já estava estabelecido: fêmeas promíscuas produzem mais ovos viáveis do que as que se limitam a cruzar com um único macho. Para as “grilas”, portanto, vale a pena ser infiel.


Uma série de outros fatores também parece contribuir para as chances de sobrevivência dos filhotes. Um deles é a constituição genética dos machos, claro. E outro, curiosamente, é o tamanho das chamadas glândulas acessórias - mais ou menos equivalentes à próstata e outros tecidos produtores de esperma em machos humanos. Em diversos insetos, os produtos das glândulas acessórias (a conta não inclui os espermatozóides propriamente ditos) parecem estimular o acúmulo de nutrientes nos ovos e o próprio ato de botá-los (ou a oviposição, se você quiser uma expressão menos chã).


Promiscuidade controlada


Como determinar que vantagem, afinal, as fêmeas que cediam aos desejos de mais de um macho estavam levando? Com sexo controlado, é claro. Numa pesquisa publicada recentemente na revista científica “Current Biology”, García-González e Simmons tomam partido de uma variante genética comum entre os grilos, a chamada “olho branco”, que só aparece em animais homozigóticos. Para quem cochilou durante as aulas de genética no colegial: é preciso que tanto o pai quanto a mãe contribuam com variantes de gene (ou alelos) idênticos para que os fihotes nasçam com olhos brancos nessa espécie. Dessa forma, os cientistas têm nas mãos uma forma simples de determinar paternidade: basta cruzar fêmeas de olhos brancos com machos de olhos brancos e de olhos pretos. Todo filhote de olhos brancos necessariamente vai ser filho de um macho com as mesmas características; do contrário, o pai tem olhos pretos.


Além desse truque, os pesquisadores tiveram o cuidado de, antes de mais nada, permitir apenas cruzamentos monogâmicos. Com isso, conseguiram estabelecer quais machos, em condições de “monopólio”, produziam mais filhotes viáveis, fazendo um verdadeiro ranking de “melhores pais” entre os grilos. Depois, cada fêmea “participante” do experimento era liberada para dois machos diferentes, um de cada tipo.


Depois de muitas e muitas sessões de orgia controlada e de um baby boom de grilos, os biólogos da Austrália estavam em condições de fazer um surpreendente resumo da ópera. O que parece estar acontecendo é que a viabilidade dos filhotes produzidos pelos machos de “menor qualidade” aumenta significativamente quando as fêmeas fecundadas por eles também copularam com os machos nota 10! O contrário acontece com os embriões gerados pelos machos mais poderosos - eles perdem algo de sua viabilidade por influência dos competidores mais “fraquinhos” -, mas o efeito, nesse caso, é menor. No fim das contas, parece que o balanço líquido para as fêmeas é vantajoso - o melhor dos dois mundos, por assim dizer.


E a coisa pode ficar ainda mais bizarra. Os pesquisadores citam outro trabalho, desta vez envolvendo pseudoescorpiões (”primos” inofensivos dos escorpiões verdadeiros), no qual a produção de filhotes entre machos e fêmeas que são irmãos pode ser viabilizada caso a fêmea também copule com machos não-aparentados! (Em tese, filhos de irmãos concentram material genético ruim e tendem a ser inviáveis.) Em ambos os casos, dizem os pesquisadores, é possível que o material nutritivo produzido pelas glândulas acessórias de um macho venha “em socorro” do que falta no esperma e no material genético do outro, restaurando a saúde da prole como um todo.


Embora a biologia reprodutiva desses bichos seja muito diferente da nossa, tais resultados estão longe de ser mera curiosidade, até porque artrópodes como esses são uma fatia substancial da biodiversidade do planeta. A interação amalucada entre os participantes do ménage-à-trois sugere que é simplista demais pensar apenas em termos de genes maternos e paternos se juntando para dar origem aos filhotes. Do ponto de vista genético, os grilos gerados por um macho de baixa qualidade não devem absolutamente nada ao pai nota 10 - mas, sem as substâncias aportadas pelo esperma dele, talvez nem chegassem a nascer. E, contra todas as expectativas machistas, quem realmente ri por último é a mamãe promíscua.

( Post publicado na coluna VISÃO DE VIDA, no G1,25 de Outubro de 2008 às 10:29 )

BRINCADEIRA SÉRIA.


Duas canções, bem diferentes em tema e qualidade lírica, normalmente me vêem à cabeça quando penso em crianças brincando. A primeira é a manjada “Bola de meia, bola de gude”, que ficou famosa na voz de Milton Nascimento (você certamente conhece: “Há um menino/ Há um moleque/ Morando sempre no meu coração” etc.). A outra eu costumava ouvir dos meus coleguinhas da pré-escola: “Gordo, baleia/ Saco de areia/ Bunda vermelha” (pra refinar ainda mais a rima, no sotaque da minha terra a última palavra era pronunciada “vermêia”). Normalmente eu encerrava a cantilena fechando os punhos e correndo pra cima deles. Acho que o contraste de temas musicais é suficiente para demonstrar o que estou querendo dizer: por mais que a gente transforme o ato de brincar numa miragem idílica da infância, a atividade também tem um lado mortalmente sério, para não dizer cruel (bem, ao menos para um menino de cinco anos acima do peso). Brincar pode ser algo tão sério, aliás, que a evolução teria embutido a tendência à brincadeira na nossa e em muitas outras espécies.


A pergunta que não quer calar é: para quê? Biólogos, psicólogos e neurocientistas estão só começando a levantar o véu que cobre esse mistério. Por enquanto, é importante se manter em guarda contra a visão ingênua de que as brincadeiras à moda antiga (como amarelinha, esconde-esconde, cantar “Gordo, baleia” para o seu amiguinho e sair correndo) são uma panacéia contra a epidemia de obesidade e maus modos que assola a criançada do século 21. Mas já há alguns indícios intrigantes sobre a importância de brincar para o futuro dos bebês de quase todo tipo de mamífero, especialmente o do bicho homem.


Vai pagar quanto?


Ao estudar qualquer aspecto da nossa biologia sob o ponto de vista evolutivo, sempre é bom pensar um pouco em termos econômicos. Nada no mundo é de graça, e as energias gastas pelos seres vivos em qualquer atividade inevitavelmente acabam entrando num balancete inconsciente de custo e benefício: vale a pena fazer tal e tal coisa? Meus competidores, que não a estão fazendo, vão sair na minha frente graças a isso?


Desse ponto de vista, o ato de brincar pode parecer uma inutilidade, um luxo. Praticamente todos os mamíferos conhecidos brincam, em especial na sua infância, mas aparentemente o fazem apenas quando estão num ambiente saudável, bem alimentados e livres de ameaças. Nossa espécie talvez seja ligeiramente excepcional porque as crianças humanas não perdem totalmente o impulso de brincar mesmo que estejam em Auschwitz ou num campo de refugiados do Sudão - embora esse impulso diminua em tais circunstâncias desastrosas.


Apesar de tudo, a prevalência das brincadeiras em ambientes normais parece exigir algum tipo de benefício biológico significativo, porque o custo é indiscutível. A começar pela energia pura: até 15% das calorias de um mamífero em crescimento são despejados no ato aparentemente inútil de brincar. E, como toda mãe neurótica do planeta sabe, as crianças vivem se espatifando quando brincam. Que o diga Robert Harcourt, zoólogo da Universidade Macquarie, na Austrália, que estudava as brincadeiras de filhotes de foca na costa peruana. Os bichinhos são um dos pratos prediletos dos leões-marinhos na região. E, segundo os cálculos de Harcourt, nada menos que 85% dos bebês-focas mortos por leões-marinhos estavam brincando. Isso sem falar no que vemos em outras espécies, inclusive a nossa: tombos, trombadas, escorregões - muitas vezes fatais. Brincar, em outras palavras, pode ser muito, muito perigoso.


E se, mesmo assim, o impulso brincalhão não desaparece, varrido pela seleção natural, alguma coisa nele está valendo a pena. É aí que entram algumas hipóteses, não necessariamente em contradição absoluta umas com as outras: muitas podem ser complementares.


Prepare-se, garoto


A idéia mais simples e intuitiva é a de que as brincadeiras são a escola da vida: quem brinca de lutar (a famosa “brincadeira de mão”, como diziam com ar de reprovação os adultos na minha infância) está treinando para lutar de verdade quando for gente grande; quem aposta corrida prepara seus músculos para correr de predadores de verdade; e assim por diante.


Por mais que a proposta pareça lógica, ela tem alguns furos. Existe uma diferença significativa nos tipos de movimentos e atitudes envolvidos, digamos, numa luta de brincadeira e numa briga de verdade, de tal forma que fica um tanto improvável a idéia de que uma coisa prepara você para a outra, ao menos diretamente. Alguns experimentos também mostram que a correlação entre o suposto “treinamento” e a coisa real é baixa: gatinhos que ganharam um monte de brinquedos durante sua infância não se tornaram caçadores melhores do que os membros de outro grupo de bichanos, que cresceu num ambiente mais sisudo, de acordo com pesquisadores da Universidade de St. Andrews (Escócia).


Graças a esses pequenos inconvenientes, outras hipóteses começaram a fervilhar. Uma delas propõe que, embora o ato de brincar não seja um treino direto para nenhuma atividade adulta, ele ajudaria o cérebro a amadurecer da maneira adequada, exercitando certos circuitos cruciais. Um dos defensores da idéia é John Byers, da Universidade de Idaho (EUA), que notou uma interessante correlação entre o desenvolvimento do cerebelo (grosso modo, a área motora do cérebro) e o comportamento brincalhão em animais como camundongos, ratos e gatos. Em suma, o que se vê é que o desenvolvimento dessa região do cérebro se completa justamente na “puberdade” - fase em que as brincadeiras finalmente diminuem, ou cessam totalmente.


Outros trabalhos experimentais também demonstraram uma correlação de mão dupla em ratos: roedores com danos cerebrais não sabem brincar, assim como bichos sem oportunidade de brincar parecem ter problemas com o desenvolvimento normal do cérebro. Há quem proponha até uma correlação entre o distúrbio do déficit de atenção - a famosa hiperatividade - e problemas de desenvolvimento neuronal ligados a um impulso não-saciado de brincar. Permitir que crianças hiperativas brinquem por mais tempo durante o dia poderia ajudá-las a controlar seus problemas de atenção, segundo essa hipótese.


Beco sem saída?


Apesar do apelo explicativo das idéias acima, alguém pode muito bem ficar com a impressão de que chegamos a uma espécie de beco sem saída. Atividades complexas e polimórficas, como é o ato de brincar, impõem desafios sérios às tentativas de desmembrá-las em suas partes essenciais e testá-las experimentalmente.


Enquanto a explicação definitiva não vem, talvez seja interessante encararmos a nossa tendência irrefreável de brincar como uma reserva de flexibilidade física, comportamental e mental. Em primeiro lugar, brincamos pelo prazer da brincadeira: pelo prazer de explorar as possibilidades de nossa interação com o ambiente e com os outros membros do nosso grupo num contexto relativamente mais seguro do que a “vida real” (embora não isento de riscos, é bom lembrar). Só por isso já vale a pena tentar proporcionar aos nossos filhos o máximo possível desse misterioso luxo evolutivo.


——Antes de me despedir, tiro meu chapéu para a jornalista científica americana Robin Marantz Henig, cujos escritos me ajudaram um bocado a entender os meandros da biologia evolutiva das brincadeiras.

(POST PUBLICADO NA COLUNA VISÃO DE VIDA,NO G1,18 de Outubro de 2008 às 09:48 .

Freud não explica (quase) nada


01 de Novembro de 2008 às 00:58
Freud não explica (quase) nada

É irônico que um especialista em demolir ídolos, um sujeito que esmigalhava idéias pré-concebidas lambendo os beiços, feito gourmet, tenha ele próprio virado um monstro sagrado. Refiro-me, claro, a Sigmund Freud, o pai da psicanálise. O problema com a canonização de Freud é simples. Assim como não dá para negar a importância do psiquiatra vienense na história das idéias do Ocidente (e, por favor, leia “história” como se a palavra estivesse escrita com neon e letras garrafais), também é inegável que o grosso do que ele propunha como explicação da mente humana é… bem, porcaria. Pronto, falei.


Também é ruim o fato de muita gente ter esquecido o Freud em começo de carreira, que desejava achar bases biológicas, neurológicas e químicas claras para os problemas mentais e dizia aguardar com ansiedade explicações “testáveis” — passíveis de verificação por qualquer um em laboratório — e físicas para esses fenômenos. Em vez disso, as pessoas endeusaram complexos de castração e de Édipo, id, ego e superego, de forma cada vez mais dogmática, até que boa parte da psicanálise virou exibicionismo literário (não é à toa que o último reduto freudiano são os departamentos de literatura das universidades). Mas, se , Darwin explica.


É o objetivo deste escriba mostrar, nos seguintes parágrafos, qual o grande acerto de Freud (sim, ele o teve, e foi importantíssimo) e, principalmente, contar como a combinação de psicologia evolutiva e neurociência reforma um bocado, e muitas vezes pode demolir, as idéias freudianas sobre sexualidade, sonhos e inconsciente. É um daqueles casos clássicos em que nem a hipótese mais elegante resiste a um aglomerado de fatozinhos desagradáveis. Vamos lá?


Inconsciente, inconsciente, inconsciente


Ao barbudo o que é do barbudo: Freud acertou em cheio ao insistir na idéia de que a imensa maioria dos nossos processos mentais se dá em nível inconsciente. Em certo sentido, isso vale até pra ações conscientes. Sabe-se, entre outras coisas, que os impulsos neuronais ligados à tomada de uma decisão pelo cérebro podem ser detectados ANTES da consciência dessa decisão (o que, para alguns, coloca em xeque até a noção de livre-arbítrio, mas essa é uma outra história). Sim, o inconsciente é o senhor da vida mental - coisa, aliás, que outros pensadores contemporâneos de Freud também diziam; ele não inventou a idéia.


O xis da questão é o porquê disso, e é justo em seu maior triunfo que o edifício freudiano começa a esboroar. O grosso do nosso funcionamento cerebral não é inconsciente porque escondemos de nós mesmos o lado negro de nosso ser, como argumentava Freud: é inconsciente porque daria trabalho demais e seria perigoso demais se não fosse.


Deixemos a coisa um pouco mais clara. Todos sabemos como é desconfortável dirigir um carro ou andar de bicicleta pela primeira vez, porque cada ação precisa ser executada de forma deliberada e consciente: pensar para dirigir só atrapalha. Uma vez que os mecanismos de guiar são internalizados, passando para a nossa memória implícita (diferente da explícita, aquela que a gente usa para guardar um número de telefone), tudo fica mais fácil - e mais seguro para motorista e passageiros.


O mesmo vale para uma série de funções do sistema nervoso, desde as mais básicas, que mantêm funcionando nossa respiração, até as reações emocionais mais diversas ou mesmo os julgamentos morais, que parecem ter uma base emocional muito forte, passando por reconhecimento de rostos e palavras, decisões sobre quem é ou não é atraente etc. É muito difícil, se não impossível, encontrar uma base racional consciente para todas essas coisas - em parte porque muitas delas são importantes demais para ser deixadas à mercê de um raciocínio lerdo. Saber distinguir entre um predador e um parceiro em potencial é um caso de vida ou morte - eis porque o controle é alegremente transferido ao inconsciente. “De pensar morreu um burro”, dizem por aí - aliás, morreu sem deixar descendentes, o que explica, em parte, porque a seleção natural favorece as espécies que não pensam demais para tomar decisões de vida e morte.


E é claro que, numa perspectiva evolutiva mais ampla, o próprio processamento mental de alto nível que nós chamamos de “consciência” é uma invenção relativamente recente, talvez privilégio de poucos mamíferos altamente curiosos e sociais, como grandes macacos, cetáceos e elefantes. O próprio peso da história do nosso sistema nervoso tende a “arrastar” grande número de funções para debaixo das asas do inconsciente.


A interpretação dos sonhos


A coisa fica ainda mais feia para o lado de Freud quando se leva em conta outra de suas idéias cruciais - a de que o conteúdo dos sonhos é uma forma de realização de desejos ocultos, que ocorre num momento de “guarda baixa” do superego (o conjunto de controles sociais e morais que faz as pessoas se comportarem de modo “aceitável”) diante do id (nosso lado instintivo e primitivo). Freud dizia, entre outras coisas, que sonhos no qual você voa são, na verdade, sonhos sobre sexo. (Como perguntou um personagem da série de quadrinhos “Sandman”: “E sonhos sobre sexo querem dizer o quê, então?”.)


O guru austríaco talvez ficasse meio cabreiro ao saber que os animais, essas criaturas proverbialmente sem superego, também sonham adoidado. Os mesmos padrões de atividade cerebral e de REM (movimento rápido dos olhos, na sigla em inglês) que caracterizam o sonhar humano também estão presentes em todas as espécies de mamíferos já estudadas, e até em aves. Os neurobiólogos ainda estão tentando entender em detalhes o que exatamente acontece durante os sonhos, mas há boas indicações de a coisa não tenha nada a ver com desejos reprimidos e tudo a ver com… seu cérebro desfragmentando.


Para quem não conhece a palavra, desfragmentar é o que o seu computador faz quando coloca os arquivos em sua memória numa ordem mais otimizada. Da mesma maneira, os sonhos parecem ser um subproduto aleatório do processo de consolidação e armazenamento das memórias que obtivemos durante o dia. Com isso, é inevitável que alguns aspectos da vida diária - inclusive as coisas pelas quais somos obcecados - acabem parando nos sonhos, mas procurar sentidos ocultos neles provavelmente é tanta perda de tempo quanto querer achar uma mensagem sobre o Apocalipse na página de teste da sua impressora multifuncional. Realidade 2, Freud 0.


Complexo de quê mesmo?


Nosso último caso de estudo, e talvez o mais complexo e interessante, tem a ver com as populares idéias de Freud sobre o desejo sexual infantil pelos pais (chamado de complexo de Édipo para os meninos e de complexo de Electra para as meninas) e os estágios de desenvolvimento na infância. Estudos em diversas culturas e regiões do mundo mostram que, se tivesse se permitido ser um pouco mais sofisticado e menos fissurado em mitologia grega, Freud teria acertado em cheio. Nenhuma pessoa normal, em nenhuma fase da vida, tem atração sexual pelos pais: nós só usamos nossos genitores como um modelo geral do que é atraente em outras pessoas.


Poucas coisas fazem mais sentido biológico do que a aversão quase universal ao incesto; até os grandes macacos evitam suas parentas mais próximas na hora de se acasalar. (Ao contrário do que dizia o psicanalista, que formulou a tese de que a “horda primordial” humana era dominada por um paizão incestuoso. Viagem pura.) Tampouco há qualquer registro de desejo sexual real de crianças humanas por seus pais. Afinal de contas, acasalar-se com parentes tão próximos, que compartilham conosco 50% dos nossos genes, equivale a concentrar grande quantidade de material genético nocivo nos descendentes e ter filhos com problemas sérios de saúde, se não inviáveis.


O fenômeno é tão importante que vale até para pais e filhos (ou irmãos e irmãs) adotivos, ou mesmo para crianças criadas juntas de forma coletiva em determinadas organizações sociais. No entanto, e aí é que está o pulo-do-gato, é estatisticamente muito provável que as pessoas se sintam atraídas por pessoas fracamente parecidas com seus pais e consigo mesmas.


A semelhança, embora pequena, é significativa, e inclui até detalhes que nos soariam absolutamente irrelevantes (circunferência do dedo anular, por exemplo - é sério!). É fácil de descobrir essa correlação analisando grandes grupos de casais. O que parece estar em jogo aí não é um desejo de consumar a sua tara de Édipo impenitente, mas sim a necessidade de equilibrar diferença e semelhança - é bom ter como parceiro alguém que não seja seu clone, mas que ao mesmo tempo mantenha algum grau de compatibilidade genética com você.


Princípio da realidade


O veredicto final, depois desses exemplos, chega a ser óbvio, mas talvez muita gente ainda precise ouvi-lo. Esquecemos com freqüência que, apesar de todo o seu brilhantismo literário, Freud realizou suas “descobertas” sobre a psiquê humana com técnicas questionáveis e pouca ou nenhuma confirmação experimental. Psicanálise funciona? Sim, mas placebo também. Nenhum edifício teórico, por mais sedutor que seja, pode ficar de pé diante do que os dados da natureza mostram.

(POST PUBLICADO NA COLUNA VISÃO DE VIDA, NO G1)

EGOISMO PRODUTIVO



Dizem por aí que é quase impossível observar em “tempo real” a evolução dos seres vivos: afinal, é o tipo de coisa que precisa de milhões para acontecer, uma escala temporal que deixa no chinelo as nossas breves vidas humanas. Os indícios de que a evolução ocorre seriam, portanto, indiretos: a gente consegue reconstruir os passos do processo, mas só em retrospecto. Em linhas gerais, o argumento está certíssimo — mas pelo visto os cientistas estão desenvolvendo uma visão cada vez mais aguçada dos processos evolutivos “quadro-a-quadro”. E eles são ainda mais malucos do que a gente imagina, a julgar pela história do “divórcio” de duas mosquinhas.
A saga dessa separação litigiosa entre insetos está sendo escarafunchada por Nitin Phadnis e H. Allen Orr, do Departamento de Biologia da Universidade de Rochester (EUA). Os bichos pertencem a subespécies diferentes, a Drosophila pseudoobscura pseudoobscura(para simplificar, vamos chamá-la de subespécie dos EUA) e a Drosophila pseudoobscura bogotana(ou subespécie de Bogotá, para os íntimos). Atualmente há um certo bafafá entre os biólogos sobre o conceito de subespécie: há quem diga que ele mais confunde do que ajuda, além de ser meio arbitrário, e muita gente preferiria jogá-lo fora e ficar só com a idéia de espécie. De qualquer maneira, no caso dessas duas mosquinhas ele até cumpre bem o seu papel clássico: o de indicar criaturas que estariam perto de se separar em duas espécies diferentes, mas ainda não chegaram exatamente lá.
Explica-se: quando uma mosquinha fêmea da subespécie Bogotá resolve juntar os trapinhos com um macho da subespécie EUA, os machos que nascem são estéreis, mas outros tipos de híbridos envolvendo as subespécies são férteis. Note que a situação é diferente do cruzamento entre cavalos (ou éguas) e jumentas (ou jumentos), cujo resultado (burros ou mulas) é sempre estéril, o que configura a plena separação de equinos e asininos em espécies diferentes. Parece que aqui a gente deu a sorte rara de dar “pause” no “filme” da evolução e ver que uma das imagens estáticas mostra o processo do surgimento de novas espécies no flagra.


Incompatibilidade


Os pesquisadores já sabiam que, no caso das mosquinhas, a esterilidade parcial dos híbridos deriva da falta de compatibilidade entre genes de cada uma das subespécies. Ao que parece, trechos de DNA do cromossomo X da variedade Bogotá (lembre-se de que o cromossomo X é importante para a determinação do sexo; fêmeas humanas têm dois cromossomos X, enquanto homens têm um X e um Y) contêm a receita para a produção de proteínas interagem de forma deletéria com as proteínas codificadas por outros cromossomos da variedade EUA. Assim, temos machos estéreis… mas não para sempre.

Sim, porque na velhice os machos híbridos podem recuperar parcialmente a fertilidade — só que produzem praticamente só filhotes do sexo feminino. Numa pesquisa que acaba de ser publicada online na revista americana “Science”, Phadnis e Allen Orr conseguiram mapear um único gene, batizado de Overdrive, que parece ser responsável pelas duas coisas, infertilidade e “preferência” por filhas — e o que ele realmente faz é um bocado maluco. Em resumo, trata-se de um gene cujo “egoísmo” parece ter desencadeado a separação entre as duas subespécies.

A expressão “gene egoísta” tem pelo menos dois significados, igualmente interessantes, mas para a nossa saga das mosquinhas o que conta é o sentido mais restrito: genes que manipulam diretamente a passagem de DNA de uma geração para outra para aumentar suas chances de serem copiados. Não é que eles tenham vontade própria: o mais provável é que algum erro na “formatação” das moléculas de DNA tenha lhes dado a propriedade de se multiplicar além da conta. Seja como for, o Overdrive faz isso aumentando as chances de que o cromossomo X, que o carrega, seja passado para as células sexuais das mosquinhas. E o que acontece se o portador do Overdrive produzir espermatozóides? Ora, ele só vai gerar filhas — e, portanto, mais cromossomos X.

É claro que, no longo prazo, isso levaria a uma multiplicação desproporcional de fêmeas em relação aos machos e, em última instância, acabaria fazendo com que os insetos “dominados” pelo Overdrive se dessem um bocado mal. Aparentemente, mutações capazes de neutralizar essa sacanagem genética foram favorecidas ao longo da evolução das mosquinhas — mas as mudanças foram tais que acabaram justamente impossibilitando, em parte, o cruzamento entre as subespécies. Allen Orr e Phadnis demonstraram isso num simples experimento de transgenia: quando eles “deram” aos machos híbridos a cópia do Overdrive presente nas moscas EUA (e não nas moscas Bogotá), sua fertilidade voltou, em parte.

Uma implicação importante desse divórcio genético complicado é a compreensão de como as espécies surgem. Normalmente, costuma-se imaginar que duas populações de uma mesma criatura se separam, colonizando dois ambientes diferentes, e ao longo do tempo as alterações genéticas vão se acumulando dos dois lados, até que a reprodução se torna difícil ou impossível. Esse cenário pode funcionar muito bem em vários casos, mas uma possibilidade alternativa é a sugerida pelo Overdrive: a alteração genética vem primeiro (no caso, um gene malandrão querendo se dar bem) e a separação reprodutiva entre as populações vem depois, quase como uma solução desesperada à tendência interna nociva. Nesse caso, não seria exagero dizer que as espécies novas surgem de dentro para fora.

(Post publicado na coluna VISÃO DE VIDA,13 de Dezembro de 2008 às 14:48, no G1)

INFINITO ENQUANTO DURE.


27 de Dezembro de 2008 às 13:27
É triste ter de dizer isso, mas ao que parece caiu por terra o último bastião do romantismo no casamento. Sabe aquele casal que nunca desgruda? No qual marido e mulher são tão unidos que quase agem como um só indivíduo? Pois até eles andam apelando para o divórcio — e por razões completamente interesseiras. Coisa de verme mesmo. O que, aliás, não surpreende nem um pouco, porque afinal de contas eles são vermes. Literalmente.
O casal em questão é formado pelo macho e pela fêmea da espécie Schistosoma mansoni, verme que causa a terrível doença tropical conhecida como esquistossomose ou barriga d’água. Quem se lembra ao menos um pouquinho das aulas de biologia que teve na escola talvez seja capaz de conjurar a imagem mental de um parzinho de S. mansoni: o macho grandalhão eternamente abraçando a fêmea, a qual vive dentro dele. Aqui vai uma foto da dupla.

Sim, os esquistossomos, até pouco tempo atrás, pareciam seguir à risca o mandamento bíblico de que marido e mulher devem virar uma só carne. O corpo do macho musculoso possui uma adaptação especial para abrigar a parceira, o chamado canal ginecofórico (em grego, algo como “carregador de mulher” — mais literal impossível). Supunha-se que, uma vez aconchegada em tal ninho de amor, a moça ali permanecesse pelo resto da vida do casal, produzindo ovo atrás de ovo. Ledo engano.
Monogamia HollywoodFaz alguns anos que os cientistas descobriram algo de podre na vida amorosa dos esquistossomos. Em vez de uma monogamia ideal, do tipo “até que a morte os separe”, os bichos na verdade estão tão sujeitos ao divórcio quanto os seres humanos do século 21. Sua monogamia, portanto, é do tipo serial, “casa-e-separa”, tal como a dos casais de Hollywood.
Restava, no entanto, saber por que os casamentos de esquistossomos fracassam. Alcoolismo? Violência doméstica? Puladas de cerca? Nada disso. Segundo um estudo recente, feita por pesquisadores franceses, a principal parcela de culpa fica por conta do comportamento frio e calculista das fêmeas da espécie, a parte aparentemente mais frágil da relação.
Os experimentos coordenados por Sophie Beltran, da Universidade de Perpignan, estão descritos em artigo na revista científica de acesso livre “PLoS One” (
que você pode ler de graça, em inglês, clicando aqui). A hipótese de Beltran e companhia não podia ser mais simples e bem bolada: como o objetivo último de qualquer casamento (principalmente no reino animal) é produzir bebês, é de se esperar que os divórcios acontecessem de olho em vantagens para a futura prole.
Como já tive ocasião de mencionar nesta coluna, o porquê de nós e muitas outras criaturas (incluindo os esquistossomos) nos reproduzirmos via sexo é um tanto misterioso. Uma das explicações mais aceitas, contudo, envolve o papel do sexo como gerador de diversidade genética. Considere um instante o fato de que você recebeu metade do seu material genético de seu pai e a outra metade, de sua mãe. Supondo que eles venham de famílias diferentes (o que, graças a Deus, é a situação usual entre humanos), é bem provável que eles contribuam com versões diferentes do mesmo gene para a “construção” do seu organismo.
Isso é um bocado bom, na maioria dos casos, porque possíveis deficiências no DNA de seu pai, por exemplo, podem ser contrabalançadas pelo gene “sadio” no DNA da senhora sua mãe. Sabemos, por exemplo, que em muitas doenças de origem genética os problemas só aparecem, ou só são severos, se o indivíduo carregar duas cópias do gene defeituoso. É por isso, aliás, que evitamos inconsciente e conscientemente o contato sexual com nossos parentes próximos. Ter filhos com uma irmã, ou mesmo com uma prima, equivale a dar mole para o azar, aumentando a chance de uma concentração de genes nocivos no mesmo corpo.
Festa estranha com gente esquisita Ora, será que esse princípio básico não estaria influenciando o divórcio entre os S. mansoni? O que aconteceria se, por exemplo, indivíduos já “casados” fossem expostos a vermes geneticamente mais diferentes deles do que seus parceiros atuais são?
Foi essa, de fato, a estratégia adotada pelos pesquisadores franceses. Antes, porém, era interessante saber qual era o sexo com maior probabilidade de iniciar o divórcio, e para isso eles manipularam a quantidade relativa de indivíduos machos ou fêmeas no corpo de um hospedeiro (camundongos, no caso). O que eles viram é que, quando há excesso de machos, o divórcio é muito mais provável do que quando há sobra de fêmeas — o que indica que elas é que estavam dando início à separação.
Próximo passo: inundar uma população de esquistossomos “casados” com machos de composição genética variada, alguns deles bem diferentes das fêmeas comprometidas. E o esperado aconteceu. Quanto maior a diferença genética entre fêmeas e machos recém-chegados, maior a chance de que elas fossem parar nos braços — ou melhor, no canal ginecofórico — deles.
É irônico que tantos divórcios humanos sejam postergados, às vezes indefinidamente, por causa dos filhos. A julgar pelo imperativo da busca pela diversidade genética, as “esquistossomas” talvez usem o mesmíssimo argumento, só que para se divorciar: “Querido, estou fazendo isso pelas futuras crianças!”.
(Post publicado na coluna VISÃO DE VIDA, NO G1)

DESPEDIDA DE 2008.


Um evento digno de atenção vai encerrar 2008 com uma bela paisagem. Neste dia 31, teremos mais uma conjunção de Vênus e da Lua. Desta vez, porém, não será tão impressionante quanto a conjunção que vimos no começo de dezembro. No final da tarde, procure pela Lua crescente, na direção do pôr-do-sol, ao oeste. Se o tempo deixar, você encontrará fácil Vênus bem brilhante ao seu lado.

Nessa mesma cena é possível vislumbrar outra conjunção acontecendo: Júpiter se “encontra” com Mercúrio mais próximo do horizonte. Essa conjunção é mais difícil de observar, primeiro porque os dois planetas estão muito baixos no céu. Em segundo lugar, porque Mercúrio é bem fraquinho, apenas em locais bem escuros ele pode ser visto.
Duas conjunções fechando 2008. A da Lua-Vênus e a desafiadora Júpiter-Mercúrio. Achar Júpiter vai ser fácil, ele está tão brilhante quanto Vênus, o desafio vai ser enxergarMercúrio.
Não custa nada tentar!

CITAÇÃO DO DIA, POR PAULO COELHO.


Por Paulo Coelho
O fim de uma etapa é apenas o começo de outra. Quaisquer perigos superar a necessária preparação estão a fazer melhor na próxima etapa.
Bem-vindo para compartilhar com os amigos - Livre Textos para uma Internet

CUIDADO COM AS PALAVRAS.


Quantas dizemos para alguém: “puxa, faz tempo que não discuto com fulano”. Ou: “nunca mais tive uma gripe”. E, de repente, no dia seguinte, pegamos uma gripe ou discutimos com fulano.
Então concluímos: se falamos as coisas boas que acontecem conosco, isto traz má sorte.
Nada disso. Na verdade, a Alma do Mundo - antes de qualquer problema - sempre nos mostra quanto tempo ficamos sem nos aborrecer com determinada coisa. Ela quer nos dizer como a vida tem sido generosa até aquele momento - continuará sendo, se superarmos com bravura o obstáculo.
Mantenha as palavras positivas no ar. Elas vão lhe ajudar a crescer em qualquer dificuldade.

( Este post foi publicado em TODAS,Terça-feira, 30/12/2008,às 00h05,no G1,coluna de PAULO COELHO).

FELIZ... ANO VELHO?


E lá estamos nós, vivendo os últimos dias do ano. Mesmo que desejasse seria difícil escrever sobre outro tema que não a iminência de 2009, preste a começar; é que o assunto se impõem de maneira avassaladora ainda que natural, se é que isto é possível.
Reparem como a época é imperativa no que se refere ao nosso estado de espírito: até dia 25 o aconselhável é sempre ceder à onda de generosidade e de amor ao próximo que assola o ocidente. E nem adianta tentar resistir, porque nosso olhar já está condicionado ao outro e às suas necessidades, à harmonia, à caridade, e ai de você se, no caminho das compras, não ficar com os olhos marejados ao cruzar com um coral, mesmo que desafinado.
Nos 7 dias seguintes o Natal passa a ser muito piegas. Todo aquele sentimentalismo meloso começa a provocar urticárias nos menos emotivos. Papai Noel vira o mala da vez e as lojas se apressam para encher suas vitrines de branco. É chegado o momento de sentir otimismo e esperança, e ai de você se não manifestar a intenção de se acabar na noite da virada.
Desde pequeno sempre estranhei esta semana que se espreme entre as duas festas, uma espécie de limbo em que nada costuma ocorrer de fato. Pobres jornalistas, em meio ao marasmo, imbuídos da árdua missão de preencher as páginas com notícias. Parece até que o tempo anda mais devagar, e talvez por saber disso os acontecimentos prefiram evitar esta espécie de “buraco negro” que existe em dezembro.
Guardam-se para os primeiros dias do mês seguinte, onde agora se concentram todas as atenções. A exceção fica por conta deste conflito na Faixa de Gaza, que aparentemente resolveu confrontar a escrita. Preferiu a sombra do apagar das luzes de 2008 aos holofotes do ano recém-começado.
Ontem fui buscar um copo d’água na cozinha e reparei que a folhinha sobre o microondas já estava em janeiro. Como assim? E os 2 dias que ainda faltam, deixaram de existir? Se nada se espera desta semana natimorta por que não mudamos o calendário e pulamos do Natal direto para 1o de janeiro? Quem sabe assim o recesso seria mais proveitoso?
Se bem que não iria adiantar. Porque, tão logo estivermos em janeiro, o único assunto vigente será o Carnaval. Há até quem diga que só mesmo depois da folia é que o ano começa oficialmente no Brasil. Então por que não emendamos logo 25 de dezembro com 1o de março, pra acabar de vez com este lengalenga? Um ano de 10 meses, mais enxuto, mais dinâmico. Só de pensar na possibilidade dá até um desânimo em relação ao modelo convencional.
Já pararam para pensar o quanto ainda teremos pela frente?
Um carro alegórico vai pegar fogo ou quebrar na Sapucaí, atrasando o desfile das outras escolas. Um casal famoso irá se envolver num exaustivamente noticiado triângulo amoroso, uma tragédia natural devastará alguma parte do globo e algum conflito vai agravar as já delicadas relações diplomáticas entre 2 países.
A crise atingirá ainda mais as nações emergentes e um escândalo político de grandes proporções balançará o centro do poder em Brasília. Como eu sei disto tudo? Aponte um ano que não tenha sido assim. Então por que não passamos de 2008 para 2010 sem escalas? Pelo menos é ano de Copa do Mundo…
Nada disso! Apesar das previsões pessimistas para a economia, dos fatos que insistirão em se repetir, apesar de ainda ter 12 meses e não ser ano de Copa, acredito que 2009 será ótimo. Porque a surpresa sempre vem de onde menos se espera, né?
Então… Feliz Ano Novo!

(Este post foi publicado em INSTANTE POSTERIOR,Terça-feira 30/12/2008, às 8h10, no G1)

sábado, 27 de dezembro de 2008

NA SUA ESTANTE ( PITTY )


Te vejo errando e isso não é pecado

Exceto quando faz outra pessoa sangrar

Te vejo sonhando e isso dá medo

Perdido num mundo que não dá pra entrar


Você está saindo da minha vida

E parece que vai demorar

Se não souber voltar ao menos mande notícia

Cê acha que eu sou louca

Mas tudo vai se encaixar

Tô aproveitando cada segundo

Antes que isso aqui vire uma tragédia


E não adianta nem me procurar

Em outros timbres, outros risos

Eu estava aqui o tempo todo

Só você não viu


E não adianta nem me procurar

Em outros timbres, outros risos

Eu estava aqui o tempo todo

Só você não viu


Você tá sempre indo e vindo, tudo bem

Dessa vez eu já vesti minha armadura

E mesmo que nada funcione

Eu estarei de pé, de queixo erguido

Depois você me vê vermelha e acha graça

Mas eu não ficaria bem na sua estante

Tô aproveitando cada segundo

Antes que isso aqui vire uma tragédia


E não adianta nem me procurar

Em outros timbres, outros risos

Eu estava aqui o tempo todo

Só você não viu


E não adianta nem me procurar

Em outros timbres, outros risos

Eu estava aqui o tempo todo

Só você não viu


Só por hoje não quero mais te ver

Só por hoje não vou tomar

minha dose de você

Cansei de chorar feridas

que não se fecham, não se curam

E essa abstinência uma hora vai passar...